Post by onikastallion on Sept 16, 2020 15:28:14 GMT -5
ONIKA STALLION EM NOVA ENTREVISTA COM A z100 NEW YORK FM
Nesta manhã, a artista Onika Stallion compareceu à sede da rádio z100 New York FM, para conversar sobre racismo e discriminação racial na sociedade. Após um longo período de hiatus do mundo da fama, a rapper decidiu mudar o foco da sua carreira e retornar com um trabalho mais coeso e aclamado. Para ela, o racismo histórico é uma questão de direitos humanos e, enquanto esses não contemplarem as demandas e especificidades da população negra, servirão somente para poucos. Ela também acredita que, para mudar esse quadro, é preciso pensar sobre como os códigos do racismo operam e buscar estratégias eficazes para lidar com ele. A entrevista foi mediada pela radialista Joanne Burbom. A rapper, através das suas redes sociais, anunciou que estaria na rádio e com isso a audiência estava altíssima. Confira abaixo a matéria completa:
JOANNE: Um bom dia à todos os ouvintes! Está no ar mais uma programação da z100 New York FM. E hoje teremos participação especial para este debate tão necessário. Onika Stallion, que voltou do seu hiatus para discutir diversas causas sociais. A rapper que retornou com seu single Futuristic Woman, está na nossa sede para este debate incrível. Seja bem vinda, Stallion! Como você está?
JOANNE: Estou bem também! Imagino que essa semana deve estar sendo altamente corrida para você. E acredito que você tenha bastante coisa para fazer hoje. Então vamos as perguntas, queremos saber a sua opinião: A marca é seu corpo negro?
JOANNE: Um bom dia à todos os ouvintes! Está no ar mais uma programação da z100 New York FM. E hoje teremos participação especial para este debate tão necessário. Onika Stallion, que voltou do seu hiatus para discutir diversas causas sociais. A rapper que retornou com seu single Futuristic Woman, está na nossa sede para este debate incrível. Seja bem vinda, Stallion! Como você está?
[ONIKA]: Bom dia!! Estou muito bem e você? Um pouco cansada da semana e ainda acordando cedo para prosseguir nos meus projetos que tenho em mente! Mas estou muito bem.
JOANNE: Estou bem também! Imagino que essa semana deve estar sendo altamente corrida para você. E acredito que você tenha bastante coisa para fazer hoje. Então vamos as perguntas, queremos saber a sua opinião: A marca é seu corpo negro?
[ONIKA]: Veja bem amada, só daria pra entender essa sentença usando um marca-texto na expressão marca. É o corpo que está sendo usado como prova mais bem-acabada de tráfico de drogas. A pesquisa investigou a questão do racismo institucional e mostrou as entrelinhas dos processos. Um dos grandes problemas é que os juízes sequer se dão ao trabalho de argumentar, de explicitar ou não o racismo — o que não ocorre em casos envolvendo judeus, quando boa parte dos casos são considerados racismo e há uma argumentação tratando o caso. Não peço que um juiz faça uma tese sobre a questão racial, mas apenas que ele dê conta do que está no processo.
JOANNE: Ultimamente, diversas pessoas acusam de vitimismo e racismo reverso nas ações do movimento negro. Como você encara essas acusações?
JOANNE: Existe uma frase assim ‘’ negro de primeira linha’’. Como você explica essa situação?
[ONIKA]: A inserção do negro nos espaços sempre é vista como a conquista de alguém que honra por ser a exceção, por ser de primeira linha, por ter estudado em Paris. Mas o racismo nem sempre é explícito, então há um esforço para tentar demonstrá-lo. É daí que surgem as acusações de “vitimismo” ou “mimimi”. Quando a pessoa assume o discurso do racismo reverso, eu uso um raciocínio lógico dedutivo que desmonta seu argumento. Se alguém disser “me chamou de branquela e fui discriminada”, pergunto: no que chamar de “branquela” inviabilizou sua trajetória numa sociedade como a brasileira? Qual é o seu prejuízo por ser “branquelo”? Você perdeu a oportunidade de emprego ou de acesso a algo? Conotação de respeito? Não! Então fica mais fácil para a gente discutir.
JOANNE: Existe uma frase assim ‘’ negro de primeira linha’’. Como você explica essa situação?
[ONIKA]: A possibilidade de o negro estar num local de poder está condicionada a sua aproximação com o padrão branco e masculino. É sempre “uma piada”, um “mal- -entendido”, um “eu não quis fazer assim” ou “eu queria ter aprendido a falar em outros termos, mas é o inconsciente”. Eu prefiro tratar a questão racial a partir das estruturas: não personalizo os episódios ou busco intenções particulares. Se há efeitos desproporcionais de violência, de não acesso e desrespeito em relação à população negra, há racismo. Pelas repercussões desse episódio, há caminho para alguma repactuação. É por isso que a intenção não importa. Nós temos que pensar como esses códigos operam para entender o mundo que herdamos e buscar ferramentas que sejam eficazes contra eles.
JOANNE: É fato que existe uma naturalização desse dizer, mas qual seu pensamento a respeito disso?[ONIKA]: Não é confortável para ninguém se defrontar com imagens construídas a vida inteira. Uma pessoa comprometida com os direitos humanos só se dá conta do seu nível de racismo quando discute branquitude. E é natural que a primeira reação seja de resistência: “não é nada disso, eu sempre me coloquei ao lado de vocês”. É por isso que prefiro quando botam o capuz. E também entendo que num determinado momento não ter conversa é do jogo. Mas se existe alguma potência nesse estado de absoluto retrocesso que vivemos, é a de instaurar um conflito real. Acho que a população negra tem recursos escassos e vai continuar disputando permanentemente, porque sempre vai ter gente de fora. E enquanto tiver gente de fora, tem que ter disputa.
JOANNE: De que modo o racismo afeta a saúde da população negra?
[ONIKA]: O povo negro está adoecendo de tudo e o genocídio é a chave para entender essa situação. Genocídio não é só extermínio. Ele também se manifesta nas estruturas do Estado, no cárcere, na escola e no sistema público de saúde. O racismo acontece no sistema de saúde quando a pessoa não tem acesso, não é reconhecida como sujeito ou demora a receber atendimento — o que nem sempre está relacionado à enfermidade que carrega. Há um arquétipo sobre o corpo negro de que ele aguenta dor e é mais forte, e que pode ser atendido num segundo momento. Ainda que os profissionais de saúde queiram oferecer o melhor tratamento possível, ele é inviabilizado devido às condições, medicamentos, falta de materiais e acesso às cirurgias que são necessárias. Esse é um dos meus objetivos. Criar clínicas de apoio à população negra de Houston. E futuramente expandir o negócio para o país inteiro ou talvez o mundo.
JOANNE: Como é possível reverter e mudar esse cenário?
[ONIKA]: O racismo se reinventa e se readequa. Eu acho que a formação profissional é um momento em que é possível perceber como operam as estruturas do racismo. Não creio que ela consiga alterar o racismo nesses grupos, mas pode indicar que o exercício da função pública exige algumas condutas. Ainda que seja racista, o agente do Estado é obrigado, pelo menos, a obedecer à impessoalidade e à moralidade administrativa. Mas eu não tenho a esperança de que é possível sensibilizar essas pessoas para que um dia venham a olhar o outro de maneira não hierárquica. Por isso acho necessário investir na formação permanente como um todo, nas faculdades de Medicina e Enfermagem, nos cursos de técnico de Enfermagem, dos profissionais que atuam dentro do hospital.
JOANNE: A formação mais humanista daria conta de mudar essa concepção?
[ONIKA]: Esse humanismo hegemônico não nos humaniza. Só um outro humanismo que atribua humanidade a todos os corpos humanos. O pensamento pós-colonial e decolonial ajuda a entender esse novo humanismo. Entendo que a formação vai além do caminho instrumental do direito. Uma saída é fomentar modelos distintos de atuação do direito com modelos alternativos de justiça restaurativa, modelos autônomos de mediação de conflito, longe de um direito técnico-formal, institucional.
JOANNE: Qual contribuição que este conceito traz para o momento atual?
[ONIKA]: A de que temos que pensar em ferramentas que deem conta do que nós, mulheres negras brasileiras ou latino-americanas, herdamos desse legado. Não temos que tentar adaptar uma solução pensada para outra realidade. Não dá para achar que na rubrica dos direitos humanos, por exemplo, será produzido algum resultado mais interessante. Se vamos falar sobre a violência obstétrica, temos de observar nossas especificidades. Não dá para ficar discutindo se a anestesia dificulta ou não o parto natural, se a nossa principal demanda talvez seja o acesso à anestesia. Não dá para continuar a sermos vistas como aquelas que aguentam dor. Temos que disputar e repactuar nos nossos termos.
JOANNE: Por que falar de direitos humanos em um contexto de desmonte de tantos direitos?
[ONIKA]: Esse momento é uma oportunidade política para a gente disputar um lugar. Nós sempre estivemos excluídos do acesso aos direitos. Agora, que a ameaça de corte é para muitos, é possível colocar os nossos termos à mesa para dar conta da nossa realidade. Creio que tem que haver uma repactuação ou os direitos humanos vão continuar disponíveis para poucos. No Brasil, os direitos humanos sempre foram tratados de maneira não racializada. Quando a realidade de pessoas negras emerge, somos obrigados a disputar categorias que determinam sua subalternização ou sua precariedade. Não creio que teremos uma organização política de massa se não permitirmos que a articulação pelos direitos envolva todos os que são diretamente afetados.
JOANNE: Qual a sua visão sobre isso para o futuro? Ou melhor, o que você prevê para ele?
[ONIKA]: Luta. Luta. Eu não tenho otimismo nas lutas internas do direito. Mas se eu não tivesse otimismo, eu estaria deprimida. Tem que ter algum grau de otimismo para manter a chama da luta acessa. A população preta não tem outra alternativa: ou luta ou sucumbe. O otimismo serve para levantar e botar a armadura antes de sair de casa. A saída é a luta, o conflito, a disputa. Não vejo outro caminho ou perspectiva.
JOANNE: Infelizmente a nossa entrevista chegou ao fim. Gostaríamos de agradecer a sua presença e de contar mais vezes com você na nossa torre de transmissão. Estamos muito felizes com o debate. E muito felizes com o trabalho lindo que você está fazendo ultimamente. Todos nós estamos ansiosíssimos para o lançamento dos próximos trabalhos e projetos. Para finalizar a entrevista, vamos ouvir o nosso single da rapper: Futuristic Woman!!! Confira abaixo o link para ouvir a música:
mdseason1.boards.net/thread/212/onika-stallion-futuristic-woman
[DIVULGAÇÃO PARA FUTURISTIC WOMAN BY ONIKA STALLION]
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[DIVULGAÇÃO PARA FUTURISTIC WOMAN BY ONIKA STALLION]